Papillon
(Papillon, 2017)
Por Bernardo D.I. Brum
Um pálido reflexo da história original.
Em 1969, a semi-autobiografia Papillon tomou o mundo de assalto. A obra foi escrita pelo ex-ladrão de jóias Henri Charriére, detalhando seus anos preso pelo governo francês em prisões e colônias penais. Na época, ficou quase cinco meses em primeiro lugar, vendendo um milhão e meio de cópias apenas na França. Desde então, já foram 239 edições traduzidas para vinte e uma línguas diferentes.
Em 1973, ano da publicação da sequência Banco e da morte de Charriére, ou Papillon, como era conhecido pela maioria das pessoas, o diretor Franklin J. Schaffner (Planeta dos Macacos, Patton – Rebelde ou Herói) dirigiu o roteiro que Dalton Trumbo (A Princesa e o Plebeu) e Lorenzo Semple Jr. (Os Três Dias do Condor) adaptaram da mídia original em um filme com Steve McQueen (Bullitt) e Dustin Hoffman (A Primeira Noite de um Homem) que, mesmo caro à época, revelou-se outro sucesso e tornou-se um clássico dos filmes de prisão.
Agora em 2017, o dinamarquês Michael Noer, em sua primeira ficção em inglês, refilma Papillon com Charlie Hunnam (Sons of Anarchy) no papel principal e Rami Malek (Mr. Robot) como Louis Dega, homem tímido e desajeitado que foi preso por fraude e que paga a Papillon por proteção dos violentos presos. Entre um cotidiano tortuoso, anos na solitária e tentativas de fuga, os dois acabam desenvolvendo uma relação de proximidade e lealdade em meio a um inferno.
Já podemos dizer que, apesar das performances principais sólidas (cercada por uma legião de arquétipos caricaturais) e uma violência gráfica mais caprichada, o novo filme falha em se justificar por si mesmo. Visualmente e estruturalmente é semelhante demais ao primeiro, guardando poucas diferenças principais e em muitos pontos até suavizando certos aspectos do outro filme, parecendo uma versão mais dinâmica e objetiva – pouco mais de duas horas ao contrário das extensas e por vezes criticadas duas horas e meia do filme de 1973.
Também, de tão bem produzido, o filme acaba sendo mais “leve” que o original. Aqui temos um filme sério e por muitas vezes sombrio, mas que falha em reproduzir o aspecto absolutamente degradante de uma colônia penal: rostos oleosos, cabelos ensebados, dentes podres, construções ruindo. Tudo parece plástico demais, bonito até, uma exaltação do espírito inabalável de Papillon e na sua crença da liberdade acima de tudo, enquanto o ponto de vista de Franklin J. Schaffner de 1973 era muito mais pungente. Lá havia um preço a ser pago; aqui é um caminho percorrido com integridade de um ponto a outro.
Noer até tenta ter algum destaque por algumas inserções próprias, como é o caso do início que mostra o dia-a-dia de Papillon antes de ser preso, seus amores em Paris e suas inimizades – mas que acaba atrasando o principal interesse do filme e logo é praticamente esquecido. O protagonista mal cita questões de seu passado aos outros. A falta de identidade própria parece predominante – há até a habitual inserção de imagens verdadeiras ao final para provar a inspiração histórica, também existente no original.
Some-se a isso uma conclusão apressada, mais aberta antes, e o novo Papillon reforça o aspecto mais heroico do que sacrificante, mais caprichado mas também mais polido, pouco escapando do toque de caixa cheio de frases inspiradoras, música óbvia, poucos momentos evocativos que parecem um tanto descolados do resto e mais o suspense em fugir e escapar do que propriamente acompanhar a transformação daquelas pessoas – e o que temos é um filme que é tentador questionar a necessidade de ser feito. Refilmar não é um problema em si – muitas refilmagens mostram-se bastante corajosas e, às vezes, mesmo refilmagens ruins são lembradas com certa indignação de como não fazer. Mas e uma refilmagem ordinária como fica? Basicamente, um produto a toque de caixa que tem seus momentos mas nunca tem brilho próprio e que já saiu pronto para ser esquecido. Não foi dessa vez que remexer o passado deu frutos.
( Fonte: www.cineplayers.com)