Os 50 anos de “Fruto proibido”, álbum de Rita Lee que mudou o rock brasileiro

Com ‘Fruto Proibido’, há 50 anos, Rita Lee afastou rock da margem no país

Por Thales de Menezes

Disco sagrou gênero no Brasil e ajudou a levar artista ao topo da constelação de estrelas que abrilhantaram a música

Há 50 anos, as lojas de discos no Brasil receberam um álbum que entraria para história como prova de que o rock poderia fazer sucesso no país e, mais importante, que Rita Lee estava destinada a ser uma estrela de primeira grandeza.

“Fruto Proibido” tem apenas nove faixas, mas é o bastante para mostrar que era possível fazer canções de rock com elementos da música pop. As guitarras estavam em sintonia com aquilo que o gênero tinha de melhor no eixo Inglaterra-Estados Unidos, mas as letras confessionais de Rita eram polaroides das questões de comportamento do jovem brasileiro.

As músicas não traziam versos de quem estava sonhando com a Londres roqueira. Rita falava de jovens tentando sobreviver no Brasil, num ambiente familiar repressivo que encontrava respaldo fora de casa na ditadura militar.

“Fruto Proibido” tem apenas nove faixas, mas é o bastante para mostrar que era possível fazer canções de rock com elementos da música pop. As guitarras estavam em sintonia com aquilo que o gênero tinha de melhor no eixo Inglaterra-Estados Unidos, mas as letras confessionais de Rita eram polaroides das questões de comportamento do jovem brasileiro.

As músicas não traziam versos de quem estava sonhando com a Londres roqueira. Rita falava de jovens tentando sobreviver no Brasil, num ambiente familiar repressivo que encontrava respaldo fora de casa na ditadura militar.

Quem viveu naquela época certamente ouviu que rock era coisa de bandido. Se dependesse do ambiente ao seu redor, Rita seria aprisionada na embalagem de uma menina bonitinha que poderia cantar umas musiquinhas, nada mais do que isso.

Tanto é que seus três primeiros álbuns solo, no início de sua carreira após deixar Os Mutantes, foram tratados com descaso por quem não a enxergava além do vocal feminino daquela banda de malucos talentosos. E a gravadora, Philips, não dava liberdade criativa para ela.

O sucesso de “Fruto Pribido” foi saboreado como uma vingança pessoal… (VER +)

DA ROLLING STONE

Leia faixa-a-faixa de ‘Fruto Proibido’ (Rita Lee & Tutti Frutti) por Luiz Carlini

Álbum lançado em 30 de junho de 1975 redefiniu o rock brasileiro no embalo de hits como “Ovelha Negra”, “Agora Só Falta Você” e “Esse Tal de Roque Enrow”

50 anos atrás, em 30 de junho de 1975, chegava a público um dos álbuns mais importantes da história do rock brasileiro: Fruto Proibido, quarto álbum de Rita Lee solo e segundo com a banda Tutti Frutti. Tornou-se o primeiro sucesso real da artista desde sua conturbada saída d’Os Mutantes e apresentou músicas como “Ovelha Negra”“Agora Só Falta Você” e “Esse Tal de Roque Enrow”.

Foi, ainda, o primeiro disco de Rita a trazer uma sonoridade mais direcionada ao glam rock em voga à época, com destaque, também, aos instrumentistas que a acompanhavam. Além da cantora, participaram Luiz Carlini (guitarra), Lee Marcucci (baixo), Franklin Paolillo (bateria), Guilherme Bueno (piano e clavinete), Rubens Nardo (vocais), Gilberto Nardo (vocais) e Manito (saxofone, flauta, órgão Hammond).

Rolling Stone Brasil conversou com Luiz Carlini sobre todas as 9 faixas que compõem Fruto Proibido. O guitarrista, vale lembrar, celebra o 50º aniversário do álbum com show especial no Tokio Marine Hall, em São Paulo, no próximo dia 9 de julho. Confira!

Faixa-a-faixa: Fruto Proibido (Rita Lee & Tutti Frutti), por Luiz Carlini

1) “Dançar Pra Não Dançar”

Luiz Carlini: “Em todo o disco tem um pianista, Guilherme Bueno. Ele era de Ribeirão Preto. Esse cara ‘desapareceu’, depois do álbum ele sumiu. Era um cara do piano blues, nesse sentido do rock. ‘Dançar Pra Não Dançar’ começa com um som meio cabaré, meio dixieland, bem charleston. Ele sugeriu isso para começar a faixa que abre o disco. Não tem nada a ver com a música, mas abre com isso. Tem até um andamento mais rápido. Depois, cai na música em si, no compasso 4/4. É algo curioso, porque quando começa aquilo, você pensa que vai para um lugar, mas não. Gosto muito dessa música. Tem uma letra legal e gosto também do solo de guitarra no fim.”

2) “Agora Só Falta Você”

LC: “Fiz a linha melódica inteira da música em casa e comecei a escrever a letra. Parei e liguei para Rita para me ajudar. Fui para a casa dela no Pacaembu tipo umas 15h e voltei às 17h com a música pronta. Ela entrou com a segunda parte da letra. Essa música virou um hit. Participou de vários comerciais, entrou em vários filmes — inclusive, entrará em dois novos filmes agora. Também é uma das mais regravadas: por FrejatPaulo RicardoZizi PossiPitty para a trilha de ‘Malhação’Maria RitaCaetano Veloso tocou em show, já vi o Chorão cantar. Um sucesso.”

3) “Cartão Postal”

LC: “Lembro de Paulo Coelho participando na casa da Rita Lee, fazendo algumas letras juntos [nota: Coelho é coautor de ‘Cartão Postal’‘Esse Tal de Roque Enrow’ e ‘O Toque’. Gosto muito de blues, então lembro que foi quando essa música apareceu que nós levamos o arranjo da gente, da banda. Foi a partir daí que a levamos para esse lado. Naquele riff inicial, tem lap steel misturado com guitarra. Gosto muito do resultado de misturar guitarra havaiana com guitarra normal. Ali, consegui fazer isso. Também tem um solo de guitarra bem legal também que acredito estar no espírito da coisa.”

4) “Fruto Proibido”

LC: “Também toco gaita nessa música. Estava começando a tocar gaita nessa época e curtindo muito — acabei abandonando depois. Lembro de algo engraçado: eu enfiava a gaita dentro de um copo d’água e ela saía com um som mais brilhante. Aí, eu estava no estúdio com a gaita e o banheiro era no andar de baixo. Desci a escada do estúdio e fui tocando. Quando entrei no banheiro, que era todo de azulejo, soou com um p#ta brilho, vivo pra caramba. Voltei lá pra cima, pro estúdio, e falei: ‘quero gravar a gaita no banheiro’. O Andy Mills [produtor] ficou: ‘como assim no banheiro?’. Aí ele pôs o microfone no banheiro e o fio desceu todo pela escada. Havia um fio pra me monitorar e outro para copiar o microfone. Pôs a fiação pela escada, caracol, até chegar no estúdio.  Aconteceu sem querer. Hoje os estúdios têm muito disso: você tem uma tapadeira que pode ser por um som mais vivo, aí atrás é de azulejo, na frente é de espelho, outro é abafado… mas aquilo lá foi um achado natural.”

5) “Esse Tal de Roque Enrow”

LC: “‘Esse Tal de Roque Enrow’ é a cara da Rita. Ela está falando da mãe e tal, que vê a filha daquela forma. Um grande clássico. Às vezes penso: essa música chama ‘Esse Tal de Roque Enrow’, mas ela é toda ‘quebrada’. Não é um rock n’ roll com levada padrão 4×4. No Tutti Frutti, isso deve-se muito ao Lee Marcucci, porque o baixo dele era todo ‘quebradão’, até por influência progressiva. Nunca vi o Lee como um baixista de black music, com levada, swing. Sempre foi mais pelas frases de baixo, algumas coisas ‘encrencadas’.”

6) “O Toque”

LC: “Os Mutantes, que foi o embrião, o começo de tudo, era uma banda mais vocal. As influências deles eram conjuntos vocais, como BeatlesThe Mamas & the Papas e Peter, Paul and Mary. Então, a Rita cantava junto deles. Sempre era junto, pouca coisa era solo. Então, quando virou Rita Lee & Tutti Frutti, ela era a cantora principal e soltou tudo isso daí. Ela também evoluiu muito como poetisa nesse disco, em uma evolução que não parou até o final da carreira. Ela era capaz de verbalizar qualquer coisa que você falasse. Então, nesse disco como um todo, ela soltou tudo. ‘O Toque’ tem uma coisa muito legal que eu sempre gostei: guitarra com caixa Leslie. A caixa Leslie é gira os alto-falantes, é usada em órgão e gera aquele efeito do início. Eu ligava a guitarra nisso e gerava aquele som. Gosto muito disso nessa música, é a característica dela.”

7) “Pirataria”

LC: “Lee Marcucci fez parte do arranjo dessa música com a Rita Lee. E é uma faixa meio quebradeira, bem a levada dele, ele a conduz..Eu era o cara mais da harmonia, enquanto ele era mais das ‘frases’. Não era dos acordes, geralmente isso ficava comigo. Cada um traz uma bagagem e nós juntamos: isso é todas as frutas, isso é Tutti Frutti.”

8) “Luz del Fuego”

LC: “Acho que a ‘Luz del Fuego’ foi uma das últimas músicas gravadas no disco, talvez tenha entrado por último, não tenho certeza. Ela soa como uma diferente das outras do álbum. Gosto muito da letra. E a introdução na guitarra… tem coisas que a fazemos com a guitarra que parece ter letra. Sempre abro o show tocando ‘Sleep Walk’ [Santo & Johnny Farina] na steel guitar e, mesmo sendo instrumental, aquilo tudo tem letra na minha cabeça. Linhas de guitarra muito rápidas e desesperadas… ok, é uma linguagem, tem vários guitarristas que tocam em alta performance. Mas penso que um trecho como a abertura de ‘Luz del Fuego’ faz parte da letra.”

9) “Ovelha Negra”

LC: “‘Ovelha Negra’ quer dizer ‘Rita Lee’. É uma música que a artista faz para ela, como Raul Seixas fez ‘Maluco Beleza’ para si. Acho que é a melhor obra da Rita Lee, de tudo que ela fez. Ela compôs essa música na nossa frente. Ela fez os primeiros acordes e eu fiz uma parte da harmonia, que é o ‘baby, baby, não adianta…’, só que sem a letra — essa harmonia toda, que é a do solo. Não consto como autor, ela não me colocou e acho que deveria ter colocado, pois fiz a harmonia após ela ter dito: ‘e agora?’. Quanto ao solo, não existia inicialmente. Eu ficava ouvindo a música no estúdio e ela só ia abaixando o volume, meio triste, vazio. Senti que deveria colocar algo. Pensei tanto nisso que sonhei com o solo e acordei assobiando. Eu recebi esse solo. Acho que isso me foi dado, pois também provoquei, de tanto pensar sobre. Não mostrei para ninguém. No estúdio, na hora da mixagem, à noite, falei que tive uma ideia de solo e ninguém quis. Tentei no dia seguinte, ninguém quis. [Diziam:] ‘Guitarrista é f#da, quer solar em tudo’. Numa terceira vez, paramos para um café, o Andy Mills me pediu para mostrar o solo. Desci para o estúdio, mostrei e voltei para a sala de mixagem. Todo mundo: ‘do car#lho, ficou lindo, ideia maravilhosa’. [Risos] Ouvimos várias vezes, então eu falei para gravarmos de novo, com outro drive, o Andy disse: ‘não, já está gravado’. E tirou a fita.”

 

FONTE : https://rollingstone.com.br/musica/leia-faixa-a-faixa-de-fruto-proibido-rita-lee-tutti-frutti-por-luiz-carlini/

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